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O Líder e a Crise

18 de julho de 2016
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    Glaucio Neves Fernandez

    O processo de mudança bem-sucedido só é possível com lideranças engajadas e integralmente comprometidas. Os papéis medulares do líder principal, em especial nos momentos de crise, são: (i) definir prioridades atreladas a uma visão de futuro; (ii) infundir confiança; (iii) garantir a disciplina de execução; (iv) promover a coesão; e (v) tomar decisões difíceis.

    Em tempos de turbulência, a pressão exercida pelos fatores fora do controle tende a empurrar o gestor principal para o imediatismo e a fragmentação da ação gerencial e essa é uma realidade que dificilmente os líderes conseguirão evitar. Todavia, deixar que sua agenda seja tomada integralmente por ações desta natureza é um erro que deve ser combatido a todo custo. O ato de liderar a mudança implica em ter clareza das prioridades, sabendo exatamente o que deve ser feito – ações importantes e urgentes- e, principalmente, o que não será feito sob pena de desviar o foco. Significa, muitas vezes, abrir mão e “desapegar” de atividades secundárias, mesmo que momentaneamente, para liberar tempo produtivo para pensar e organizar as ações mais estratégicas. A definição de prioridades só é possível quando o objetivo da mudança está claro para todos e é sabido aonde se quer chegar. Para isso, definir as prioridades atreladas a uma visão de futuro que mobilize os corações e as mentes dos envolvidos é o primeiro passo importante a ser dado.

    O segundo é fazer com que as pessoas trabalhem motivadas e energizadas para execução das prioridades e na direção da visão de futuro, o que muitas vezes é uma tarefa difícil por conta do ambiente adverso e por todas as externalidades negativas inerentes a um movimento de transformação. As pessoas costumam se motivar por causas que fazem sentido para vida delas ou para as comunidades nas quais elas pertencem e os incentivos não-financeiros costumam ser bastante efetivos nestes momentos. Desafios técnicos, senso de pertencimento e possibilidade de crescimento intelectual são benefícios, às vezes, mais mobilizadores do que uma quantia em dinheiro. O papel da liderança aqui é incutir nas pessoas o “sentimento de dono” e fazê-las acreditar que é possível superar as adversidades.

    Um dos maiores problemas no Brasil é a baixa capacidade de execução daquilo que é planejado. Costumamos ser melhores planejadores do que “fazedores” e a disciplina de execução não é um atributo tão valorizado na nossa cultura, quando comparado com a capacidade de inovação ou de formulação de soluções. Dotar as pessoas de disciplina de execução não significa amarrá-los em uma camisa de força intransponível, onde o que foi planejado não pode ser mudado, mas sim cuidar para que o ciclo de planejamento, ação, monitoramento e avaliação gire de forma virtuosa e que os ajustes naturais de percurso aconteçam com método e coordenadamente entre os envolvidos. Significa também gerar avanços de curto prazo que possam ser celebrados, além de garantir um placar vivo em tempo real indicando o progresso das ações planejadas.

    A pior coisa que pode acontecer em um esforço de mudança é a baixa coesão gerencial e institucional, onde pessoas do mesmo time trabalham descoordenadas ou com objetivos conflituosos. Um time coeso é aquele que as partes se complementam e todos sabem e exercem o seu papel de forma virtuosa, tal como uma boa banda de jazz onde o improviso individual é permitido, mas sem tirar a harmonia melódica nem o brilho do coletivo. O papel do líder na banda é indicar o sequenciamento das músicas e ajudar no encaixe dos arranjos sem desafinar, ou seja, oferecer feedbacks, orientar e estimular a colaboração das equipes, servir de exemplo e dar vida aos processos de trabalho. Também neste campo, a capacidade negocial para busca de consensos é um atributo essencial para promoção da coesão entre os membros da equipe e entre as diversas partes interessadas envolvidas no esforço de mudança.

    Por fim, o principal papel do líder é tomar decisões difíceis, mesmo sabendo que muitas vezes pode desagradar boa parte dos envolvidos nos problemas. Essa é uma atribuição indelegável e que deve ser feita da forma mais racional possível, considerando a maior quantidade de variáveis disponíveis no momento e levando em conta os riscos e as consequências associadas. Em toda decisão está embutida uma escolha e muitas vezes abrir mão de caminhos mais fáceis para adotar medidas estruturais mais duras pode garantir a sustentabilidade de longo prazo de uma empresa ou governo.

    Em resumo, a liderança, que é a capacidade de inspirar e por equipe em ação na direção desejada, é um fator crítico para superar crises e desafios. Não consiste em controle, direção ou manipulação; sua essência é alinhar a energia das pessoas com objetivos atraentes e pelos quais vale a pena lutar.

    Sobre o autor

    GLAUCIO NEVES FERNANDEZ. Sócio Diretor da Macroplan. Engenheiro de Produção (UFF), com pós-graduação em Gerência de Projetos (FGV-RJ) e MBA Executivo (Coppead/UFRJ). Em 15 anos de consultoria coordenou e atuou em mais de 50 projetos, em instituições públicas e privadas de grande porte. Na Macroplan, dirige projetos nas áreas de planejamento, gestão para resultados e gestão estratégica da inovação.