Policy Papers

Gestão para resultados, quais os principais desafios?

25 de março de 2019
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    Glaucio Neves e Gustavo Morelli | Diretores da Macroplan

    Os desafios da Gestão para Resultados (GPR)

    Fonte: Macroplan.

    É preciso expandir a oferta de serviços públicos de qualidade, com maior produtividade do gasto. Seguindo a tendência da última década, a maioria dos estados não atingirá as metas do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) do Ensino Fundamental II e nenhum deles alcançará as metas do Ensino Médio em 2021. Em 2022, a maioria ainda apresentará índices de mortalidade infantil superiores aos considerados aceitáveis pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e ainda estará distante da universalização do acesso ao saneamento básico adequado.

    Fonte: Estudo da Macroplan “Desafios da Gesão Estadual | DGE 2018”, disponível em: www.desafiosdosestados.com.br

    Mas, na prática, quais os novos desafios para que se conforme um modelo inovador de gestão estratégica orientado para resultados? A proposta aqui descrita decorre da atuação da Macroplan junto à gestão pública nos três níveis de governo nos últimos 30 anos, além de criteriosa análise sobre o “estado da arte” dos paradigmas que têm suportado os processos de reforma e modernização da administração pública em países diversos [1].

    A análise das experiências indica atraso em nossas práticas de gestão em relação aos benchmarks mundiais. Indica ainda que, apesar de alguns relevantes esforços, elas são insuficientes para responder aos desafios que se apresentam à administração pública brasileira. Permanecem enormes gaps no aprimoramento da qualidade das políticas públicas, na eficiência do gasto, na profissionalização da gestão de pessoas e no envolvimento dos cidadãos na formulação e na gestão das políticas públicas.

    A construção de estados mais competitivos, capazes de gerar prosperidade distribuída e mais qualidade de vida a todos os seus cidadãos, requer um novo patamar de desempenho da gestão pública brasileira: mais ágil, mais eficiente e mais efetivo.

    São oito os principais desafios para a construção de uma gestão efetivamente orientada para resultados.

    Elaboração: Macroplan

    Visão estratégica de Estado

    O período de um mandato é insuficiente para provocar mudanças estruturais e sustentáveis na realidade de um estado. O desafio é avançar ao longo dos diversos mandatos governamentais, o que requer visão estratégica de estado e não apenas de governo. O foco de uma estratégia de estado deve contemplar ações continuadas, fortalecedoras e de aprofundamento da intervenção a cada período, construindo trajetórias estratégicas no caminho da Visão de Futuro que se deseja para o estado.

    O planejamento não deve se encerrar no período de um mandato. Precisa estar contextualizado em um objetivo maior e mais longo para que possa conduzir o estado por uma rota segura e sustentável de desenvolvimento.

    A visão para além dos mandatos dos governantes demanda um processo aberto de formulação estratégica e de definição das prioridades do governo, orientado pelas demandas dos cidadãos e por uma leitura ampla e prospectiva dos desafios do desenvolvimento.

    A execução requer modelos multi-institucionais de governança e integração aos instrumentos formais de alocação de recursos dos governos – os Planos Plurianuais e os Orçamentos Públicos. Esse é um desafio a ser enfrentado pela maior parte dos governos: fazer com que o planejamento anteceda e subordine, de fato, o orçamento e a alocação de recursos, tornando a gestão alinhada às grandes prioridades do estado.

    Gestão baseada em evidências – Foco e seletividade

    Um importante desafio na gestão pública é saber o que funciona e por que funciona. E, a partir de bons diagnósticos, aprimorar a ação e otimizar os gastos. A gestão baseada em evidências visa apoiar os gestores na tomada de decisões bem informadas sobre políticas, programas e projetos. Essa abordagem contrasta com a política sustentada por “opiniões”, ideologias, preconceitos ou especulações [2].

    Os programas e as políticas de desenvolvimento geralmente são elaborados para alterar resultados, por exemplo, aumentar a renda, melhorar o aprendizado ou reduzir o número de doenças. Mas as carências e os desafios a serem superados e, por conseguinte, os resultados a serem alcançados não são homogêneos nos territórios nem tampouco nos segmentos da população. Realidades distintas demandam estratégias distintas, com foco e seletividade para alcançar maior impacto.

    Produzir resultados significativos implica combinar diagnósticos precisos, análises de evidências disponíveis quanto ao funcionamento (ou não) das políticas, foco e prioridades bem estabelecidas. Os desafios de cada estado não se distribuem de modo homogêneo pelo conjunto dos municípios nem pelos segmentos da população. As realidades são distintas e a contribuição de cada uma para o resultado estadual é diferenciada. Assim, as políticas devem ter o máximo de foco e seletividade para alcançar maior impacto.

    Apenas com políticas construídas a partir de robustas evidências e uma estratégia regionalizada e segmentada direcionada para as necessidades específicas de cada território e cada público é possível reduzir disparidades, otimizar esforços e recursos.

    Integração das ações e cooperação entre os entes da federação

    A efetividade da maior parte das políticas públicas decorre da integração intragovernamental (entre as diferentes áreas) e intergovernamental (entre os diferentes níveis de governo). Sem os municípios, em especial, o estado não avança nos temas estratégicos, como educação e saúde, por melhor que seja a ação governamental nas políticas sob sua responsabilidade[3]. A prática, contudo, é de concorrência e desarticulação nas ações. É preciso superar as rivalidades políticas e a visão setorial, tradicional, em que as políticas públicas são implantadas isoladamente umas das outras, levando à perda de sinergia.

    Na gestão para resultados, o estado deixa de concorrer para acentuar as funções de coordenação e complementação da prestação de serviços onde houver ganhos de escala e maiores níveis de complexidade. Organiza, capacita para a operação e lidera a gestão de grandes sistemas e redes, tais como os da educação, saúde, segurança pública, assistência social e gestão ambiental. Fomenta e regula ação regionalizada e/ou consorciada para criar formas alternativas de ação que façam convergir esforços, recursos e competências.

    Internamente, articula a organização funcional do governo, tradicionalmente setorial, com a execução das políticas em torno de áreas de resultados, a exemplo da juventude, para estimular a integração na ação e otimizar o uso dos recursos.

    Atuação em parceria com o setor privado e o terceiro setor

    A articulação entre os diferentes níveis de governo é crucial, porém não suficiente. Nesse novo modelo de ação pública, é fundamental o conceito de ampliação dos atores na prestação de serviços públicos e de interesse público, o que se estabelece por meio de parcerias com o setor privado e o terceiro setor. Entre eles, o instrumento de parcerias público-privadas, tanto em projetos de investimento quanto na prestação do serviço propriamente dito.

    O setor privado pode participar da viabilização de projetos de interesse do estado, principalmente daqueles em que há viabilidade econômica atrativa e existência de competências empresariais instaladas. Já as entidades do terceiro setor realizam atividades classificadas como de interesse público, ou seja, atividades que visam aos mesmos resultados pretendidos pelo estado para a sociedade. O estado, por sua vez, regula, supervisiona e cobra resultados com base em estruturas de regulação profissionais e legislação que garanta adequada segurança jurídica a todos os envolvidos.

    Na moderna gestão, a ação pública não mais se encerra nas fronteiras das organizações governamentais, sendo executada por meio de uma rede de atores diversos, envolvidos e articulados em torno de objetivos comuns.

    Monitoramento da ação e avaliação de resultados: central de Resultados

    O “fazer acontecer” no âmbito da gestão pública implica o estabelecimento de práticas de monitoramento como um processo contínuo e simultâneo ao gerenciamento. O objetivo é provocar decisões necessárias e no tempo adequado, a fim de superar os obstáculos e os problemas que eventualmente surjam durante a execução das ações, e garantir o alcance dos resultados pretendidos.

    Na gestão por resultados, não se trata apenas do acompanhamento tradicional dos programas governamentais com a finalidade de antecipar e provocar decisões que removam os obstáculos à execução, sejam de natureza técnica, financeira ou política. Essa função foi originalmente cumprida em boa parte pelos governos por meio de escritórios de projetos ou de prioridades. Essas estruturas, porém, se mostraram insuficientes para garantir os resultados por se concentrar na execução das ações, no cumprimento dos prazos e escopo, e não no alcance desses resultados.

    A central de resultados é focada na agenda estratégica do governo. Orienta sua ação para ampliar o alcance dos resultados. Avalia a execução dos projetos a partir do impacto (outcomes), e não apenas dos produtos (outputs). Em muitos casos atua para revisar projetos com adequado andamento do físico e financeiro que tendem a não produzir as transformações planejadas. Para tanto, é intensiva no uso de dados, em especial os registros administrativos, para a elaboração de análises antecipatórias que promovam adaptações no rumo das ações ao longo da sua execução. O que interessa é a efetividade da ação e não apenas a obediência a prazos, custo e escopo.

    A central de resultados atua também para selecionar políticas e projetos que mereçam passar por avaliações de impacto, idealmente externas, que permitam estimar seus efeitos no público-alvo. Essas avaliações possibilitam medir a efetividade das ações e realizar análises do tipo custo x benefício para aprimorar as políticas e os projetos.

    Elaboração: Macroplan.

    Atração de líderes de alto desempenho

    Entregar políticas de qualidade à população, em ambiente com restrições crescentes de recursos e com redes de relacionamento e controle cada vez mais complexas, demanda pessoas capacitadas, aptas a enfrentar a diversidade dos desafios da gestão pública.

    Um importante fator propulsor de uma boa gestão é a seleção e alocação de lideranças e talentos gerenciais de alta capacitação nos postos-chave da execução das ações estratégicas de governo. Pois trata-se de profissionais que irão administrar somas expressivas de recursos, gerenciar grandes equipes, além de executar políticas estruturantes para o desenvolvimento dos estados. Com poucas exceções, a gestão de pessoas em funções estratégicas no setor público ainda é marcada por práticas ultrapassadas, baseadas em loteamentos dissociados de critérios de competência, como o conhecimento técnico necessário para ocupar posições cruciais na máquina pública.

    Colocar os profissionais mais adequados nas funções mais apropriadas para a execução da estratégia, sobretudo nos postos de liderança, requer práticas de gestão e desenvolvimento de recursos humanos pouco presentes na gestão pública. Esses profissionais devem ser encontrados dentro e fora do governo. Seja por meio de seleção e alocação de servidores talentosos e com capacidade de liderança em postos-chave dentro da estrutura governamental, seja pela busca ativa no mercado privado por meio de programas concebidos especificamente para atrair profissionais capacitados e treinados, mesmo que temporariamente, para o ambiente da administração pública.

    Mecanismos de avaliação de desempenho, desenvolvimento continuado, políticas de remuneração alinhadas com o mercado e defesa jurídica para proteção em relação às ações realizadas no exercício da função pública são outros Instrumentos que o sistema de gestão de pessoas precisa aprimorar com a finalidade de garantir atratividade e profissionalismo ao provimento dessas funções.

    Inovação e digitalização

    É preciso inovar para superar a abordagem burocrática, cuja característica principal é a atribuição de ênfase à administração dos meios, para um foco mais nítido em resultados. Inovar é diferente de somente criar ou ser criativo, é preciso ir além e fazer que o que foi criado gere valor social e transforme as vidas das pessoas. Inovar requer método e disciplina de execução.

    De modo mais concreto, inovar na área pública significa alcançar patamares mais elevados de qualidade na execução das políticas e produtividade na aplicação dos recursos públicos. Implica construir soluções institucionais mais eficientes e rápidas, no atendimento, pelo Estado, das demandas da sociedade. Combinar inteligências e capacidades empreendedoras internas e externas ao governo, para desenvolver soluções destinadas à superação de problemas em benefício da sociedade. Muitas vezes soluções simples que repensem os fluxos a partir do entendimento da jornada do cidadão ou que introduzam uma nova forma de fazer, mais ágil e eficiente, como o trabalho da pastoral da criança no tema da redução da mortalidade infantil [4].

    A digitalização é uma importante estratégia para ampliação da capacidade de inovação. O Estado brasileiro está obsoleto e hoje em dia ainda funciona predominantemente no ‘modo analógico’ – que é muito mais lento, caro e sujeito a falhas do que o ‘modo digital’. O desafio que se coloca é de avançar rapidamente em direção a um governo digital [5].

    Governo digital coordena serviços de áreas distintas e integra bases de dados e serviços a partir da orientação no usuário (cidadão e empresas). Inverte a lógica do desenho de serviços, partindo da real necessidade do cidadão para a construção de soluções em conjunto e com interações constantes com os usuários, por meio de tecnologia da informação. Inova no relacionamento Sociedade-Estado, a partir da gestão das redes de usuários que passam a se conectar na busca de soluções e aprendizados que viabilizem a prestação de serviços ao cidadão e às empresas de modo mais rápido e fácil.

    A digitalização do governo amplia e facilita o acesso do cidadão às políticas públicas; confere maior agilidade a prestação de serviços, melhora a qualidade das políticas (análises preditivas, big data, micro focalizações), reduz a burocracia, amplia a transparência na divulgação do que é feito, de quanto custa, quais os beneficiários e os resultados alcançados, ajuda no combate a corrupção; e viabiliza maior interação com a sociedade na identificação de demandas e na construção das soluções.

    Transparência, participação e comunicação

    Os desafios atualmente colocados à ação do estado, através da implementação de suas políticas públicas, têm assumido elevado grau de complexidade. Consequentemente, exigem respostas que sejam capazes de considerar toda a diversidade e a multiplicidade das variáveis, dos setores e dos atores envolvidos. A cobrança por transparência e participação é crescente.

    A viabilização e a legitimidade das ações passam a depender cada vez mais da existência de processos de negociação, de envolvimento e de comunicação permanentes com os Poderes formais constituídos (Executivo, Legislativo e Judiciário), assim como com os segmentos representativos da sociedade civil.

    Os governos não podem mais limitar seu relacionamento com os cidadãos aos canais formais de comunicação. É preciso alcançar de modo massificado, customizado e constante os diferentes atores sociais. É preciso inovar nos mecanismos de comunicação com a sociedade para estabelecer contato direto e em tempo real com o cidadão na ponta e, assim, captar expectativas, demandas e buscar engajamento. O uso intensivo das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) e dos métodos de gestão de redes complexas será fundamental na nova gestão pública.


    [1] Para maiores detalhes, ver “Práticas e metodologias de gestão para resultados” e “Um novo modelo de administração pública” Disponível em: www.macroplan.com.br/publicacoes

    [2] Davies, Philip. “Is Evidence-Based Government Possible?”, Jerry Lee Lecture 2004. Disponível em: https://webarchive.nationalarchives.gov.uk/20091013084422/http:/www.nationalschool.gov.uk/policyhub/downloads/JerryLeeLecture1202041.pdf Unit.

    [3] Para uma análise sobre a importância da cooperação entre estado e municípios, ver Policy Paper Nº 1 “Novas formas de concertação estado-município para acelerar a produção de resultados”. Disponível em: www.macroplan.com.br/policypaper

    [4] Alves, José Eustáquio Diniz “Zilda Arns e a mortalidade infantil”, 2010, disponível em: www.ecodebate.com.br/2010/02/09/zilda-arns-e-a-mortalidade-infantil-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/

    [5] http://www.mbc.org.br/portal/wp-content/uploads/2017/06/manifesto_brasil_digital.pdf


    Elaboração

    Glaucio Neves| Autoria

    Gustavo Morelli | Autoria

    Adriana Fontes | Revisão técnica

    Kathia Ferreira | Revisão de texto

    Luiza Raj | Projeto gráfico

    Tatiane Limani | Projeto gráfico